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Para meus amigos vegetarianos :-)

Li este artigo no Estadão recentemente e gostei. Compartilho abaixo…

E pra compensar, indico aqui o blog vegetariano mais bonito e apetitoso que conheço – veganyumyum.com – que além de belas receitas, tem uma seção que fala bastante sobre fotografia de comida (neste link).

Fernando Reinach*

Vegetais não gemem, estrebucham ou suplicam quando são sacrificados para saciar nossa fome. Isto explica porque muitos que criticam a criação e o abate de animais não têm pruridos em mastigar órgãos sexuais ainda vivos (brócolis), engolir embriões em desenvolvimento (brotos de feijão), deixando para os sucos gástricos a tarefa de matá-los, ou picotar o corpo que ainda respira de diversos vegetais (saladas em geral).

Nossa ilusão de que vegetais não se comunicam e não têm mecanismos sofisticados para resistir à morte se deve ao fato de eles se comunicarem não por sons ou gestos, mas por meio de moléculas químicas, cheiros e hormônios que muitas vezes sinalizam seu desconforto ou tentam repelir ataques. Recentemente foi elucidada a sofisticada comunicação entre uma couve-de-bruxelas, uma borboleta que adora devorar suas folhas e uma vespa que se alimenta das larvas da borboleta.

A couve-de-bruxelas (Brassica oleracea) está feliz tomando sol em seu jardim quando pousa sobre ela uma linda borboleta branca (Pieris brassicae). A borboleta deposita sobre as folhas seus ovos fecundados – uma ameaça para a couve, pois os ovos se transformarão em larvas famintas. No terceiro dia, como por milagre, os ovos são localizados por uma vespa altamente especializada.

Esta vespa (Trichogramma brassicae) injeta seus ovos dentro dos ovos da borboleta. As larvas da vespa se alimentam do conteúdo dos ovos da borboleta, matando-os. O resultado é que a couve se safou. A morte passou perto.

Esse jogo entre a couve, a borboleta e a vespa pode parecer uma simples cadeia alimentar, mas há anos descobriu-se que por trás dele está uma complexa rede de comunicação.

A primeira descoberta é que a vespa é avisada sobre a localização dos ovos da borboleta. Esta comunicação ocorre por meio de um cheiro, uma molécula volátil detectada pela vespa.

Sem entender porque os ovos da borboleta “avisariam” as vespas, os cientistas foram investigar o fenômeno e descobriram que quem emite o cheiro não são os ovos da borboleta, mas a folha de couve.

O sistema é bastante sofisticado: a planta “percebe” que os ovos foram depositados e “espera” dois dias antes de emitir o cheiro que atrai as vespas. Essa espera se deve ao fato de os ovos da borboleta só poderem ser infectados pela vespa após começarem a se desenvolver, o que leva dois dias. A conclusão é que a couve “sabe” que corre risco de ser devorada, mas, sem mãos para remover os ovos, desenvolveu um método para atrair o inimigo de seu inimigo.

ANTIAFRODISÍACO

Mas a história é mais complicada. Agora os cientistas descobriram como a planta “sabe” que a borboleta pôs ovos nas suas folhas. O líquido que envolve os ovos tem uma molécula chamada BC (benzyl cyanide). Ela “comunica” à folha que foi atacada, desencadeando a resposta que atrai as vespas. O interessante é que a borboleta não pode se “disfarçar”, deixando de produzir o BC, porque ele é fabricado pelo macho da borboleta, que injeta o produto na fêmea durante o ato sexual. Mas porque o macho injeta BC nas fêmeas? Este composto é um antiafrodisíaco, usado para avisar outros machos que aquela fêmea já foi fecundada.

Da próxima vez que você mastigar couve-de-bruxelas se lembre que está matando um ser capaz de receber e enviar mensagens, capaz de pedir ajuda quando ameaçado de morte. Bon appétit.

*fernando@reinach.com
Biólogo
Mais informações: Male-derived butterfly anti-aphrodisiac mediates induced indirect plant defense. PNAS, vol.105